quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Sobre os comentários recebidos pela publicação de "A valsa dos meus vestidos"

Eu agradeço muito por seu texto, Thiago, sobre um suposto poder que teriam, os meus versos, de ressignificar as vidas de quem me lê. Um carinho que me deixa mesmo feliz e eu tento deixar que apenas a moça Fulana se emocione e explore suas próprias emoções neste blog, mas aí acho que estaria seguindo os planos de minha amiga bela Renata Belmonte, mas, é mesmo impossível, quando o material é feito das mais descabidas confissões, é mesmo impossível não criar uma espécie de máscara, uma personalidade qualquer que trabalhe uma emoção ou uma vida que é apenas minha, mas dela faça outra coisa (e aqui já entra a fala perspicaz do Ronaldo sobre os meus textos)... E isso já existe desde Ritos de Espelho. Há uma outra criatura, minha sombra talvez, que manipula os materiais que encontra dispersos nessa bagunça bem esquisita de ser alguém, de ser mulher, de ter 20 e tantos anos, de ser tantas expectativas, de ser cada coisa que amigos, desafetos e desconhecidos enxergam como uma figura real, e que não é menos real que ter nascido menina, numa manhã de quinta-feira, primeiro de março, no subúrbio do Rio de Janeiro, em pleno calor, gordura e vidinha "marromenos"... É minha vida, mas já é uma outra coisa que eu nem mesmo vivi, que já é completamente diferente e aí já é Fulana quem toca, quem experimenta, quem forja, quem manipula, quem joga ... e foi o Drummond quem me ofereceu esse meu Golem, essa Fulana, saída de uma ópera ou de um teatro barroco, que a tudo exagera e devora e rasga... Conversas sobre escritas, aparições, encontros e farsas que sempre tenho com Renata Belmonte e Vanessa Buffone, e concordamos que nunca sabemos o que foi verdade e o que foi só mais um embuste dessa coisa estranha de se existir num corpo único e numa única história que se diversifica em versões tão contrárias, como numa sala de espelhos ou numa casa de palavras...
E Fulana diz mistérios,
diz marxismos, rimmel, gás.
Fulana me bombardeia,
no entanto sequer me vê.
..
E sequer nos compreendemos.
..
Mas Fulana será gente?
Estará somente em ópera?
Será figura de livro?
Será bicho? Saberei?
..
Fulana às vezes existe demais;
até me apavora.
Vou sozinho pela rua,
eis que Fulana me roça.
..
Olho: não tem mais Fulana.
Povo se rindo de mim.
..
Fulana é toda dinâmica,
tem um motor na barriga.
..
Fulana, como é sadia!
Os enfermos somos nós.
..
(O Mito, Carlos Drummond de Andrade)





Eu só tenho a agradecer aos que lêem o que mostro por aqui.



Inaê Sodré no recital Fêmeas, Teatro Sesi, 2007
foto: Wagner (Pyter)


4 comentários:

Anônimo disse...

miranda há sempre um outro no eu da nossa literatura, um monstro por um lado emocional e carinhoso e por outo lado muito racional e furioso ou o oposto. o certo é que escrever não é nunca se esconder e nem mesmo se revelar, antes escrever é a busca de um encontro e ao mesmo tempo um outro encontro um encontro que não buscamos.
eu poderia afirmar que nos desconhecemos mais a cada escrita que realizamos. e que as palavras não tem vida propria mas desencadeia em nós muitas coisas que mesmo vivas, permanecem secreta e antes permanece um nada. e miranda escrevemos porque somos nada e loucamente queremos corpo, solidez, queremos está firme, ser firme, quando somos gases. areia movediça.
miranda quando pensamo que somos jão não somos pois nunca somos apenas estamos. e não concordo com essa ideia que escrevemos porque negamos esse mundo, negamos a nossa vida, não, escrevemos porque não nos completamos, e sabemos, e sentimos que não somos, por isso somos mais.
beijos

Wagner Pyter disse...

­­
tô famoso, big brother, não sou um zé ninguem! :P

Anônimo disse...

Meu muito obrigado. Agradeço bastante por continuar escrevendo, tecendo decifrações que redimensionam certos gestos. Você Buffone e Renata estão entre as autoras que mais aprecio de uma nova geração com vontade de transformar, de tecer novos significados. Sua homenagem a Drummond lembrou-me um dos mais singelos versos do mestre: “De mim mesmo sou hóspede secreto”. Hóspedes secretos, para sermos mais exatos. Aquele abraço. Thiago

Senhorita B. disse...

Tenho sorte de ter encontrado pela vida amigas como você e Vanessa.
Bjs

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